Projeto Respire oferece assistência jurídica voluntária para casos de racismo

Por Naiara Rodrigues

O Respire – Advocacia Antirracista – oferece assistência jurídica gratuita para pessoas negras que sofrem injúrias ou ofensas por causa de sua cor.

Desde quando foi criado, em agosto de 2020, o grupo de defensores já está à frente de 40 casos judiciais e sua atuação abrange os estados de Minas, Bahia e Distrito Federal. Carlos Augusto Santos, especialista em Direito Constitucional, é idealizador do projeto e conta que a ideia nasceu pautada por sua vivência enquanto homem negro e advogado que sempre quis atuar em prol de pessoas negras de forma voluntária, e tomou forma com o auxílio de amigos e colaboradores.

A atuação do projeto iniciou-se em meio ao movimento mundial pelas vidas negras desencadeado pela morte de George Floyd, nos EUA, em 2020. “Vemos um projeto como uma resposta a esse sufocamento causado pelo racismo, uma forma de respirar mesmo.

O Direito não combate o racismo, até porque ele não é uma questão jurídica, mas o Direito é também uma ferramenta que podemos utilizar para tentar minimizar os efeitos dele no cotidiano, diminuir essa sensação de impunidade que nos acompanha em diversos setores da vida”, afirma Carlos.

Atualmente, o grupo conta com 18 advogados de diversas especialidades como civil, penal, trabalhista, constitucional, entre outras, que têm em comum a luta contra o racismo. “Um dos objetivos do grupo é colaborar para a formação de uma jurisprudência que paute as questões raciais, que enxergue as questões raciais sob um novo viés. A gente entende que essa discussão racial só será feita no judiciário, quando advogados começarem a levar teses para apreciação do judiciário”, afirma Carlos.

Assim como na nossa sociedade, o racismo estrutural também se faz presente dentro de nosso sistema judiciário. “Precisamos entender que nenhuma opressão se sustenta sem o apoio do judiciário. Partindo dessa ideia, existem diversos desafio que se colocam na nossa atuação, no enfrentamento do racismo”, ressalta Carlos.

Entre os desafios está a baixa representatividade de negros no Judiciário. De acordo com o levantamento de Perfil Sociodemográfico dos Magistrados, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2018, apenas 18,1% dos juízes brasileiros se declaram pretos e pardos, sendo que apenas 6% são mulheres negras. “Fora essa questão da baixa representatividade, a gente ainda enfrenta uma cultura que tende a minimizar e banalizar os efeitos do racismo, pois, nem sempre, na verdade é muito raro, um magistrado branco olhar para certos casos e enxergar ali uma hipótese de racismo”, destaca o idealizador do projeto.

Outra problemática apontada pelo defensor é a dificuldade técnica de aplicação do direito previsto para esses casos. “É muito rara uma sentença que condene alguém pelo crime de racismo, baseada na nossa lei de antirracismo. Ela é uma lei extremamente difícil de ser aplicada, assim como à de injúria racial, também prevista no nosso código penal, que acaba sendo desqualificada para injúria simples, na maioria dos casos, sobre diversos argumentos”, explica o advogado que indica a obra Racismo Recreativo, do professor Adilson Moreira, como uma leitura para se entender melhor a dificuldade no judiciário brasileiro de enfrentar casos de racismo.

“Ele aborda como o judiciário enfrenta os argumentos trazidos pelos réus de que, muitas vezes, a injúria racial não tinha a intenção de ofender, mas tão somente de fazer uma piada, uma finalidade humorística e, por isso, acaba não caracterizando crime, já que um dos requisitos que caracterizam um crime de injúria é a intenção de ofender. Uma vez que não se tem intenção, juridicamente torna-se impossível subsumir o crime àquela hipótese”, exemplifica o defensor.

Apesar da dificuldade de aplicabilidade das leis, Carlos enfatiza que é preciso denunciar o crime de racismo e seguir na luta pelo avanço do debate racial no judiciário. “Não podemos deixar que a nossa descrença no sistema se torne um obstáculo para que a gente leve nossas demandas e busque respostas a casos de violência como esse”, conclui.

Para requerer a assistência jurídica do projeto, basta preencher o formulário que consta no Instagram @respire.advocacia e aguardar contato da equipe.

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