Festival de Arte Negra de Belo Horizonte – 28 anos de reexistência 

Por Rosália Diogo – Jornalista

Integrante da Comissão Artística do FAN-2023. Coordenadora do Centro de Referência da Cultura Popular e Tradicional Lagoa do Nado. Chefe de Redação da Revista Canjerê.

A décima edição do Festival de Arte Negra de BH – FAN foi realizada entre os dias 23 e 29 de outubro. Neste ano, o FAN BH abraçou a temática “Trança – “Tríade Temporal”, explorando as conexões culturais entre o Brasil e a África, notadamente as influências da cultura bantu na formação da identidade brasileira e sua relação com Minas Gerais.

Com periodicidade bienal, o Festival compreende uma ampla programação cultural, marcada pela diversidade de linguagens artísticas e pela participação de artistas, grupos e pesquisadores da arte e da cultura negra. As referências do FAN BH articulam as raízes ancestrais dessa cultura às expressões da contemporaneidade.

O tema escolhido para a residência artística foi “Coração Tambor” e teve como intuito proporcionar o encontro de gerações e linguagens, e entrelaçar os fios que costuram histórias e memórias. Na encruzilhada entre o passado, o presente e o futuro da cultura preta, um elemento sempre se faz latente: o TAMBOR. A batida do tambor imita o som do coração, traz vida e conexão. Esse pulsar que é afro diaspórico está presente nos graves do funk, nas rodas de capoeira, nos quilombos, nos terreiros e na pele que reverbera e habita a cidade. 

Trança foi o conceito curatorial criado para o FAN  2023. Um dos maiores símbolos da cultura africana.  Expressão estética e de resistência de todo um povo. Ferramenta de sobrevivência durante o período da escravidão (tecnologia ancestral); TRANÇA é o conjunto formado pelo entrelace de três partes.

Três conceitos africanos fundamentam o tripé que sustentaram o FAN 2023:

SANKOFA AFROFUTURISMO UBUNTU

Um ideograma Adinkra que ensina sobre o valor de aprender com o passado para a construção do presente e do futuro. Adinkra é um conjunto de símbolos. Tecnologia africana ancestral pertencente ao povo Ashanti. Movimento cultural, estético e político que se manifesta no campo da literatura, do cinema, da fotografia, da moda, da arte, da música, a partir da perspectiva negra, e utiliza elementos/conceitos tecnológicos para criar narrativas de protagonismo negro, projetando um futuro que celebre sua identidade, ancestralidade e história. “Afrofuturismo é recriar o passado, transformar o presente e projetar um novo futuro, através da ótica do povo negro”.

Termo antigo da região Sul Africana, presente nas línguas Zulu (pertencente ao grupo linguístico bantu) e xhosa, que literalmente significa “humanidade”. A filosofia Ubuntu resgata a consciência de que uma pessoa é parte de algo maior e de que o indivíduo depende do coletivo. “Sou o que sou pelo que nós somos”. A convivência social deve estar pautada na fraternidade, altruísmo, respeito, acolhimento e colaboração entre os seres.

Trazemos nas próximas páginas, os destaques de alguns momentos da programação do Festival. Aconteceu uma roda de conversa aberta ao público com a Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, com o tema “Futuros Desejáveis, Caminhos Possíveis: reflexões sobre cultura preta, tecnologias ancestrais, cidadania e reparação histórica”.

Na roda, representantes da juventude negra, do Congado, do Sagrado de Matriz Africana, da Diretoria de Reparação e Promoção da Igualdade Racial e do Movimento Negro. A ministra também participou de um bate-papo, reservado apenas para convidadas e convidados, no Kilombu Souza, que teve a representação de outros kilombus urbanos da cidade.

No que se refere à musicalidade, destacamos a participação de Chico Cesar e do Grupo Fundo de Quintal, além de outras várias apresentações de artistas locais.

As artes visuais ocuparam a região da Praça da Estação, o Parque Municipal Américo Renê Giannetti, o Teatro Francisco Nunes, o Mis e outros espaços descentralizados.  O audiovisual se destacou a partir de uma Mostra de Filmes no Mis Cine Santa Tereza.

Vamos apresentar os três conceitos centrais que nortearam a curadoria do Festival:

Sankofa: Este termo provém da língua Akan, falada em Gana e Costa do Marfim. O símbolo Sankofa é representado por um pássaro com a cabeça voltada para trás, buscando um ovo em suas costas. Esse conceito simboliza a ideia de voltar ao passado para buscar conhecimento e sabedoria, reconhecendo que nossa história e tradições são fundamentais para nosso futuro. No contexto do FAN BH 2023, o Sankofa é um chamado às novas gerações para que se reconectem com as raízes culturais e históricas.

Afrofuturismo: O Afrofuturismo é um movimento cultural, artístico e filosófico que combina elementos da cultura africana e da ficção científica visando imaginar um futuro inovador e positivo para as comunidades negras. Este movimento investiga a diáspora africana e a identidade negra em um contexto futurista, muitas vezes, questionando identidade, pertencimento e tecnologia. No FAN BH 2023, o Afrofuturismo é uma maneira de empregar a criatividade e a imaginação para construir um futuro mais brilhante, mantendo-se conectado às raízes culturais.

Ubuntu: Ubuntu é uma filosofia africana que enfatiza a importância da comunidade, da interconexão e da empatia. A palavra “ubuntu” significa “eu sou porque nós somos”, destacando a ideia de que nossa própria existência está intrinsecamente ligada à dos outros. No contexto do FAN BH 2023, o Ubuntu é um chamado para a solidariedade, a colaboração e o apoio mútuo, promovendo um senso de unidade e pertencimento na celebração da cultura afro-brasileira.

Ojá – Mercado das Trocas.

Com origem na palavra Yorubá, que significa “Mercado”, o Ojá é reconhecido como um espaço de movimentação da Economia Criativa no Festival de Arte Negra de Belo Horizonte que promove a circulação de recursos, a realização de encontros e a troca de ideias e afetos. Também tem como objetivo destacar o trabalho de afroempreendedoras e afroempreendedores pretas e pretos de BH e Região Metropolitana, criando uma Rede de novos negócios e oportunidades. O Ojá este ano aconteceu no Parque Municipal Américo Rene Giannetti.

Já aguardamos, com alegria no coração, o FAN 2025.  

Vida longa para o FAN.

Compartilhar

Procurando algo? Faça uma pesquisa e encontre mais notícias entrevista ou edições.

VOCÊ TAMBÉM PODE GOSTAR