Edimilson de Almeida Pereira é um homem das Letras

Por Silvia Cristina Silvado, jornalista formada pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), licenciada em Letras e pós-graduanda em Comunicação Pública

Um homem das Letras

Edimilson de Almeida Pereira é um homem das Letras: poeta, ensaísta, professor e pesquisador. Nascido em 18 de julho de 1963, esse mineiro de Juiz de Fora é um dos maiores nomes da literatura contemporânea.  É graduado em Letras, especialista e mestre em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Pesquisa a cultura e a religiosidade afro-brasileira. Também é mestre em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e doutor em Comunicação e Cultura por um convênio entre a UFJF e UFRJ. Completando o rico currículo acadêmico, é pós-doutor em Literatura Comparada pela Universidade de Zurique, na Suíça, além de professor titular de Literatura Brasileira na UFJF. 

Colecionador de prêmios

O autor está entre os brasileiros mais premiados da literatura nacional. Sua coleção de prêmios começou em 1984, quando venceu o concurso de contos “Palavra/Vivani” em sua cidade natal. No ano seguinte, foi o primeiro colocado no “Concurso Nacional de Literatura Editora UFMG” na categoria poesia.

No ano seguinte, foi intensamente premiado. Venceu o “Prêmio João Ribeiro”, da Academia Brasileira de Letras, pela publicação de “Mundo Encaixado: significação da cultura popular” (em co-autoria com a professora Núbia Pereira de Magalhães Gomes/UFJF). 

Também em 1994, e em uma parceria com a professora Núbia Pereira de Magalhães, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), venceu o prêmio “Dr. Antônio Procópio de Andrade Teixeira”, oferecido pela UFJF, pelo conjunto de quatro livros publicados no projeto “Minas e Mineiros”. Ainda nesse ano, recebeu o prêmio “Marc Ferrez”, conferido pela FUNARTE/RJ, pelo projeto de ensaio fotográfico e textos intitulado “Filhos do Rosário em nome do Pai”, também em parceria com a professora Núbia.  

Em 1997, o autor e a professora vencem o “Concurso Sílvio Romero de Monografias sobre Folclore e Cultura Popular “/FUNARTE/RJ devido ao trabalho “Os tambores estão frios: estudo sobre a tradição banto no ritual de Candomblé em Minas Gerais”. Em 1998, conquistou o primeiro lugar no “Concurso Nacional de Poesia Helena Kolody”, promovido pela Secretaria Estadual de Cultura do Paraná e o “Concurso Nacional de Poesia Cidade de Belo Horizonte”, da Secretaria Municipal de Cultura. 

Em 2002, venceu o “Concurso Sílvio Romero/FUNARTE/Centro Nacional de Folclore Popular-RJ” com a monografia “A saliva da fala: notas sobre a poética banto-católica do Congado”.

Em 2004, foi o vencedor do “Prêmio Vivaldi Moreira” na categoria “ensaio” com o texto “Os Signos dos Ancestrais: significado sócio-cultural do candomblé em Minas Gerais”.

A beleza do engajamento sutil

Não há espaço nesta publicação para nomear a quantidade de trabalhos do autor, pois sua obra é abundante, com uma extensa lista de artigos e livros publicados desde seus 22 anos de idade, quando estreou no mundo literário com o volume de poemas “Dormundo”. O autor passeia pela poesia, prosa, crítica e faz produções de cunho etnográfico, resultado de pesquisas de campo voltadas a compreender a produção cultural surgida da diáspora africana no país. 

Sua obra, apesar da beleza estética, não se resume à função lúdica. Ele é poeta e acadêmico, e tem o dom de unir universos aparentemente distintos. Apesar da grandeza e pompa de ser um autor de envergadura elevada na cultura nacional, um dos mais importantes autores da literatura contemporânea, é uma pessoa gentil e cortês que nasceu entre trabalhadores e cursou a escola pública, instituição que ele diz ter sido essencial na contribuição para seu amor pelas letras.

“Não há um momento específico que marcou essa minha aproximação à literatura. A soma de vários acontecimentos na vida de uma criança nascida em bairro de trabalhadores é que foi criando as condições para essa experiência. Não há dúvidas, no entanto, de que minha entrada e permanência na escola pública foi um dos fatores decisivos para a descoberta da escrita, dos livros e do universo que podemos acessar através deles”, comenta o autor. 

Sua obra também apresenta uma simbiose entre aquilo que é belo e ao mesmo tempo comprometido com questões sociais, sem estereótipos, sem lugares-comuns. Questionado sobre o papel da literatura nas questões sociais, ele diz que esse é um tema complexo, mas afirma que ela proporciona a liberdade de vivermos o nosso imaginário.   

“Creio que a literatura pode também – mas não somente – desempenhar um papel na análise das questões sociais. Ela nasce de uma estrutura histórico-social, considerando a biografia dos seus autores e autoras, e da aplicação prática da linguagem em nossa comunicação. Isso já demonstra uma interferência da literatura no real.

Porém, penso desde outra perspectiva: se a linguagem é um mecanismo relativo de abordagem do real (ou seja, o que dizemos ou escrevemos não é, de fato, o que foi vivido), há nela uma série de frestas que nos permitem simular outras dimensões de sentimento e de realidade. Essa invenção de outros mundos é, para mim, uma forma radical de vivermos o nosso imaginário e, consequentemente, o nosso desejo de liberdade”. 

Sobre essa liberdade, há de se pontuar que ela aflora quando o autor cria mundos imaginários, porém pautados no real. Com personagens irreais na existência, mas reais na verossimilhança, com suas complexidades tão humanas, o autor desenha com suas mãos que tão bem tecem as palavras, outras possibilidades de mundo.

“Particularmente, penso a escrita literária como uma possibilidade de ver por outros ângulos o mundo em que vivemos. E, além disso, como um desafio para criarmos outras lógicas de mundo. Isso implica dizer que valorizo as contradições, as ambiguidades, as tensões, as rupturas, as disjunções e a polissemia características de uma personagem verossímil. Ou seja, o eu da minha escrita pode até ser, caso desejemos, uma realidade, embora este não seja um caminho obrigatório para a leitura do que escrevo”.

Sobre o papel de sua obra para as questões sociais, ele enfatiza que o saber produzido depende de seus interlocutores para gerar efeito e que sua contribuição reside na proposição de reflexão e diálogo. “A literatura é um saber compartilhado e depende de inúmeros fatores para que os seus significados possam aflorar.

É na troca com o(a)s leitores(a)s e com os contextos histórico-sociais – em transformação – que temos a oportunidade de saber se aquilo que escrevemos tem uma certa importância ou não. Entendo que se há uma contribuição de minha parte, ela reside na tentativa de instaurar um diálogo com as pessoas e com a sociedade na defesa dos direitos humanos, das outras formas de vida e da liberdade de expressão, bem como no combate à violência e a todo tipo de discriminação”, reflete Edimilson.

Sobre a importância de sua obra para a visibilidade negra, ele reflete: “Tenho pensado e escrito sobre as várias dimensões das culturas negras no território da diáspora africana. Esse é um tema que interage com outros que me ocupam como sujeito de um processo histórico abrangente.

O tempo, que é um bom fazedor de antologias (como diz o poeta Iacyr Anderson Freitas) tem participação efetiva na construção do significado das obras que escrevemos. Esse aspecto e o diálogo com outras pessoas – junto das quais tento compreender as nossas histórias – é que vão dizer se há espessura ou não no trabalho que venho realizando”, completa o autor.

Edmilson, que caminha entre mundos diversos, escreve para adultos e crianças e lançou, em novembro de 2021, “O Ausente”, pela Relicário Edições, romance ambientado na paisagem rural. Ausente é o nome da região onde vive Inocêncio, personagem que narra a trama, mas, às vezes, assume o papel de espectador em paralelo com os diferentes ângulos que experimentamos na vida.

O romance une a sabedoria tradicional (Inocêncio é curandeiro) e o conhecimento acadêmico, mostrando ao mundo a união que habita dentro do próprio autor.

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